O município de Ipanguaçu sempre teve no rio Pataxó uma de suas principais riquezas. Até pouco tempo atrás, a população convivia de forma harmoniosa com o rio e retirava dele até mesmo o seu sustento, através da pesca e do cultivo de pequenas lavouras.
Porém, nas últimas duas décadas, o rio Pataxó e os habitantes de Ipanguaçu deixaram de se entender. Culpa do próprio homem, que passou a agredir o rio, que respondeu com muita força, ou melhor, muita água.
Quem mora em Ipanguaçu há muito tempo, conta com detalhes como foi a transformação do rio Pataxó, que deixou de ser aliado e passou a ser inimigo de milhares de pessoas nessa pequena cidade da região do Vale do Açu.
O casal de aposentados Francisco Joaquim da Costa e Anália Bento da Silva viveu e envelheceu em Ipanguaçu. Há nove anos, eles moram no bairro de Ubarana, de onde já foram expulsos várias vezes nesse curto período de moradia.
Seu Francisco conta que antes o rio era calmo, e morar em seus arredores não representava perigo algum. "Mesmo quando o inverno era forte, o rio se comportava e não tinha esse problema de alagamento", relembra.
Com muita experiência, o ex-agricultor denuncia que o rio Pataxó foi bastante castigado pelo homem. "Tanto que não é possível entendê-lo (o rio) hoje em dia", frisou seu Francisco, explicando que antes se sabia para onde a água do rio corria, mas hoje em dia a água toma percursos diferentes a cada ano, o que acaba pegando os moradores de surpresa.
Dona Anália, companheira de história do agricultor, diz que não aguenta mais sair de casa por conta dos alagamentos. Ela lembra que foi expulsa pela água cinco, seis vezes em apenas nove anos. "Já levantamos os móveis e estamos nos preparando para deixar nossa casa mais uma vez", declara a aposentada, do quintal, observando a água que se aproximava. No dia seguinte à visita da reportagem do DE FATO, o casal de aposentados foi levado para um abrigo, pois a água já havia invadido a residência deles.
O prefeito de Ipanguaçu, Leonardo Oliveira, conta que os problemas de inundações na cidade começaram há cerca de 20 anos. Tudo por conta do assoreamento do rio Pataxó, que foi se intensificando a cada ano que passava.
Leonardo reconhece que todo esse problema foi criado pelo próprio homem, que interferiu no percurso natural do rio. "Muita coisa foi feita nesses vinte anos ao longo do rio, como passagens molhadas e diques, obstruindo e interferindo no percurso natural da água", reconhece.
A indústria também contribuiu para a "revolta" do rio.
A produção de frutas pelo sistema de irrigação, por exemplo, exigiu alterações no Pataxó, sendo construídas diversas paredes de contenção de água e também passagens molhadas para o escoamento da produção.
Com tantas agressões ao Pataxó, os alagamentos em Ipanguaçu parecem ser mais uma resposta da natureza, já vista em tantos outros lugares. Cabe ao homem se adaptar à natureza, e não o contrário.
Agricultores viram canoeiros ‘profissionais’
Os alagamentos no município de Ipanguaçu estão causando transformações até mesmo no mercado de trabalho. Alguns agricultores, por exemplo, deram uma trégua no campo e agora se transformaram em canoeiros.
Com muitas localidades rurais ilhadas, a Prefeitura local decidiu contratar agricultores para prestarem o serviço de canoeiro e transportarem os habitantes que não conseguem sair de casa com um transporte que não seja a canoa.
Francisco Eldes Barbalho é um dos canoeiros. Diariamente, ele está transportando dezenas de moradores da localidade de Luzeiro.
A rotina de Francisco não é mole. Ele acorda cedo e às 5h da manhã começa a transportar os trabalhadores que precisam chegar ao outro lado da localidade, onde está localizada a empresa na qual eles atuam.
O "expediente" do canoeiro é encerrado por volta das 17h30, quando os trabalhadores retornam do dia de trabalho e precisam ser levados de volta para casa.
Nesse ínterim, Francisco passa o dia todo transportando outros moradores do Luzeiro. Gente que precisa fazer compras, ir ao médico ou realizar outro tipo de atividade qualquer. Afinal, a vida não para por conta dos alagamentos.
O agricultor José Inaldo de Brito é um dos usuários dos serviços do canoeiro.
A reportagem do DE FATO encontrou o agricultor no momento em que ele retornava para casa com a família, após fazer compras na "cidade". "A gente pega essa canoa aqui e outra mais na frente para poder chegar a nossa casa", relatou José.
Os serviços dos canoeiros contratados pela Prefeitura se tornaram indispensáveis em outras 12 localidades ilhadas de Ipanguaçu.
Dragagem do Pataxó é a solução prometida
A solução para os problemas de alagamentos em Ipanguaçu é um projeto de macrodrenagem no rio Pataxó. Na semana passada, o ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho, anunciou que R$ 7,3 milhões seriam liberados para fazer a principal parte do projeto, que consiste na dragagem do Pataxó.
A promessa foi feita em Brasília, quando Fernando Bezerra Coelho participou de audiência com a governadora do Estado, Rosalba Ciarlini, e a bancada federal do Rio Grande do Norte, deputados federais e senadores.
O projeto, feito através de uma emenda parlamentar de R$ 1 milhão da deputada federal Fátima Bezerra (PT), prever toda a limpeza do Pataxó, que atualmente se encontra muito assoreado.
Leonardo Oliveira informa que a areia acumulada no rio será retirada, aumentando a sua profundidade. "Com esse sérvio, a água pode seguir seu percurso natural e desaguar no rio Piranhas Açu", explica o prefeito.
Hoje, tem ponto do rio Pataxó que não chega a seis metros de largura por conta do assoreamento.
Com a dragagem, o rio ficará com no mínimo 15 metros de largura e uma profundidade a partir de 6 metros. "Essa obra vai resolver as inundações e devolver ao povo de Ipanguaçu o direito de viver bem", ressalta Leonardo.
Não existe ainda previsão para que o serviço seja iniciado.
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MAGNOS ALVES Da Redação do Jornal de Fato
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