Alex Costa
Da Redação de Natal/Jornal de Fato
Mailson Ferreira cursa Pedagogia na UFRN e está estagiando. |
O olhar preconceituoso ou de compaixão das pessoas gera, em muitos deficientes visuais, um comodismo que os leva a estacionar e viver uma vida restrita do que o mundo pode lhes oferecer. Mas existem aqueles que não se dobram diante das dificuldades e são capazes de derrubar todos os preconceitos para ver cumprido o propósito de suas vidas.
Natural de Ipanguaçu, Marilson Ferreira da Silva, de 39 anos, começou a perder a visão totalmente aos 30 anos. Em consequência do diabetes, a visão do comerciante começou a ficar comprometida. "Me olhei no espelho e via manchas vermelhas no vidro. Limpei, mas não saíam. Ao esfregar os olhos, o sangue que estava na minha retina se espalhou e a mancha sumiu; então percebi: estou com algum problema em minha vista".
Gradativamente, a visão de Marilson foi desaparecendo. Ficar cego, para ele, foi a pior das experiências da sua vida. Mas era preciso adaptar-se. Não desistindo de crescer na vida, o comerciante ingressou no Instituto de Cegos do Rio Grande do Norte (IERC), no qual aprendeu braile e atua como professor voluntário. O fato de ver pessoas acomodadas em sua realidade de cegueira o incomodava. Era preciso mais do que isso para ser uma pessoa totalmente feliz: era preciso lutar, crescer e se tornar independente, em meio às dificuldades.
Ao conhecer Vanessa, uma amiga com deficiência visual que também frequentava o IERC, percebeu que a jovem era diferente. Ela estudava Pedagogia na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e não desistiu dos seus sonhos em meio à falta de visão. "Eu vi nela alguém parecido comigo que queria correr atrás de objetivos. Por isso, decidi enveredar pelo mesmo caminho, até porque sempre gostei de crianças", conta.
Em 2009, depois de 20 anos sem contato com os estudos, Marilson prestou vestibular para Pedagogia. Pediu a prova em braile e logo recebeu um portfólio com quase 200 páginas. "É muito extensa a linguagem em braile. O tempo disponível para a prova era curto para que eu apurasse todo aquele material. Então, decidi optar por um leitor que, com um gravador, me ajudou na elaboração da prova e eu pude confiar no que estava fazendo", disse.
Atualmente, o estudante está no terceiro ano da faculdade e já estagia no Núcleo de Educação Infantil da UFRN, como professor infantil. "É bem diferente o contato das crianças com a gente. Elas estranham ter alguém que não as vê falando com elas, mas contemplando-as olhos nos olhos. Me enxergo como uma pessoa que não desiste de lutar e isso é bom para os pequenos, que terão de passar por muitas escolhas, desafios e conquistas nas suas vidas", considera Marilson.
O mundo começou, então, a ser explorado por um homem cego, mas com uma visão superior à natural. Marilson descobriu que os olhos não veem tanto quanto o tato, os ouvidos e o coração. "Entender o mundo com os sentimentos é muito mais agradável e desafiador", diz.
Independente, Marilson conta também com o apoio de sua família. Sua irmã mais nova, Uberlânia Ferreira da Silva, não poupa esforços para ver a realização pessoal do seu irmão. "Ele é a pessoa mais esforçada da família e não há barreira que o impeça de avançar. Ele é assim: um exemplo de perseverança para todos que o conhecem", pontua.
Nas ruas, Marilson reclama apenas de uma coisa: falta de acessibilidade. Com sua bengala, ele desvia-se dos carros nas calçadas, dos buracos nas ruas e de vários obstáculos. "Eu não falo só por mim. Falo por idosos e deficientes físicos que não têm o vigor que eu tenho. É preciso mudar essa realidade", frisa.
Para Marilson, querer chegar a algum lugar depende da força de vontade e seu maior sonho é que cada vez mais deficientes, sejam de que tipo forem, consigam entrar na universidade e crescer na vida. "Só assim o mundo passará a ser mais tolerante com a gente e as oportunidades aumentarão. Hoje, eu não me vejo mais como um perdedor, mas como um vencedor que quer fazer outros vencerem", encerra.
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