O Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea/RN) decidiu, após a constatação de um processo de erosão na parede da barragem Armando Ribeiro Gonçalves, localizada no município de Itajá, realizar uma série de vistorias em todas as barragens e açudes do Estado para verificar o estado de conservação das mesmas. De acordo com o presidente do Crea, Adalberto Pessoa, a situação de Armando Ribeiro Gonçalves serve como alerta para as outras barragens do RN.
Emanuel AmaralNa barragem Armando Ribeiro Gonçalves não é difícil identificar as fendas. Enquanto os moradores da área estão preocupados, os técnicos garantem que não há risco
A maior barragem do Estado, e uma das maiores do Nordeste, tem duas grandes “fendas”, de cerca de um 1,5 metro de profundidade, seis metros de comprimento e dois de largura, fruto de um processo de erosão iniciado com as chuvas no ano passado. De acordo com especialistas ouvidos pela reportagem da TRIBUNA DO NORTE, e por um relatório produzido pela Crea/RN em visita técnica, a erosão ainda não implica em riscos para a barragem. Mas a contínua falta de manutenção poderia causar danos suficientes para que a construção não suporte a força da água.
“Até esse momento o problema não representa riscos imediatos, mas essa situação serve para que nos preocupemos com as outras barragens e açudes, porque muitas vezes o Governo tem problemas orçamentários que impedem a manutenção”, diz Adalberto Pessoa. De fato, a manutenção deve ser feita todos os anos porque as fendas causadas pela erosão são comuns após períodos chuvosos de maior intensidade, contudo no ano passado não houve recursos para tanto. Em anos anteriores, houve o mesmo problema, pontos de erosão se formaram, mas foram prontamente consertados. De acordo com engenheiros, já chegou a se ter oito fendas no açude, mas nenhuma do tamanho das atuais.
As vistorias do Crea devem ser feitas em conjunto com outros órgãos, inclusive da administração estadual e federal, como é o caso do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs) – responsável pela administração de Armando Ribeiro – e a Secretaria Estadual de Recursos Hídricos, que responde pelas barragens e açudes estaduais. Todos os órgãos participantes serão oficiados hoje para participar das visitas. Segundo o Crea, a perspectiva é que até a próxima quarta-feira as equipes já estejam em campo. O Conselho promete fixar até a próxima segunda-feira o calendário de visitas que embasará o relatório. “Iremos entregar esse relatório para toda a imprensa e divulgaremos para a sociedade”, garante o presidente do Crea.
A preocupação do Conselho, que coincide com a do engenheiro agrônomo Samuel Fernandes, residente em Assu e primeiro a atentar e denunciar o fato, não é com os danos na parede da barragem em si, mas com a falta de manutenção. “No atual estado, trata-se de uma pequeno problema que pode ser contornado com uma obra de pequeno porte. Mas estamos em época de chuva e, caso não seja feito nada, o ponto de erosão já pode aumentar e com o tempo criar problemas maiores. Não há alarmismo, é um processo natural da barragem, mas que necessita de cuidado”, explica Samuel Fernandes.
De acordo com a gerência regional do Dnocs em Assu, o dinheiro necessário para realizar os reparos na parede da barragem é de cerca de R$ 350 mil. “Não é dinheiro de outro mundo, mas infelizmente às vezes não se consegue dar a resposta em tempo hábil. É uma característica da administração pública”, diz Paulo Rodrigues, responsável pela regional naquela área.
Dois pontos apresentam erosão mais grave
A reportagem da TRIBUNA DO NORTE visitou a barragem Armando Ribeiro Gonçalves, localizada no município de Assu, com o engenheiro agrônomo Samuel Fernandes para ver de perto a extensão das fendas.
É possível identificar que existem duas de maior porte, embora mesmo um olhar leigo possa facilmente concluir que existem algumas outras em formação. Os dois pontos de erosão estão localizados na segunda metade da extensão da parede, obviamente do lado que não entra em contato com a água represada.
Um dos primeiros pontos que chamam a atenção na parede da barragem é que ela é aparelhada por um sistema de calhas, cujo objetivo é fazer com que a água da chuva escoe pela parede com menos prejuízo para a estrutura física da construção. O sistema de calhas, de acordo com o gerente regional do Dnocs, Paulo Nogueira, é dividido em dois: a parte de cima escoa água para dentro da barragem e a parte de baixo para a parte plana do terreno, logo abaixo da parede. É justamente no ponto onde essas duas divisões se encontram que se localizam os pontos de erosão. Nesse local, as calhas estão quebradas.
Segundo a explicação do engenheiro Samuel Fernandes, corroborada pelo Dnocs, as calhas não suportaram o grande volume de água proveniente das chuvas no ano passado. Essa água tanto transbordou para os lados quanto acabaram por danificar as calhas. Como o líquido descia pela parede de forma livre, carregando detritos, os “buracos” foram se formando e se aprofundando com o tempo.
No fim, o sistema de calhas é projetado para evitar exatamente o que ocorreu: que a força da água da chuva inicie processos de erosão na parede. “Com certeza eles terão de rever a capacidade das calhas, porque aparentemente elas não foram projetadas para um volume de água tão intenso quanto foi visto em 2009”, opina Samuel Fernandes.
No ano passado, a região que a barragem compreende recebeu o dobro da precipitação comum (de 600 mm para 1,2 mil mm). Tudo isso ainda é agravado pela falta de vegetação da parede da barragem. Segundo Samuel Fernandes, o ideal é que haja vegetação rasteira no local, mas o clima da região impossibilita que a grama se estabeleça.
Para resolver o problema o processo é simples, de acordo com o gerente regional Paulo Nogueira. São necessários materiais fáceis de ser encontrados como barro e brita. “Você preenche os buracos com esse material e compacta com um rolo. É uma obra realmente bem simples”, conta.
Diretor do Dnocs diz não haver riscos
A obra do trecho que sofreu erosão, na parede da barragem Armando Ribeiro Gonçalves, estava prevista para ser realizada em 2009 e só não ocorreu devido à “insuficiência de verbas”. O trabalho, que inclui retirada da vegetação e preenchimento dos buracos abertos pela água, deve ser realizado no início deste ano, antes do período chuvoso. No entanto, o coordenador geral em exercício do Dnocs no RN, João Guilherme Souza Neto, garante que mesmo que a obra viesse a ser adiada novamente, não haveria qualquer risco à barragem.
“O que há ali não é uma fissura, mas uma erosão causada pelas chuvas. Erosões são comuns em todas as barragens, não é nada de extraordinário, é um processo natural, e já faz parte de nossa rotina a manutenção dos reservatórios. Fazemos um levantamento, conseguimos recursos no Ministério da Integração e realizamos a recuperação”, apontou. O levantamento em relação à barragem do Vale do Açu está em andamento e deve ser apresentada à coordenação nacional do Dnocs ainda este mês, como prioridade no Rio Grande do Norte.
O último grande serviço de manutenção da Armando Ribeiro foi realizada entre 2007 e 2008. “Esperávamos fazer novamente ano passado, mas os recursos foram insuficientes. Por isso, deve ser feito agora no início de 2010”, prevê, sem arriscar uma data específica, mas garantindo ser antes do período chuvoso, que no semiárido potiguar tem início no segundo trimestre do ano. Para ele, a erosão atual representa um problema mais visual, porque em nada afetaria a estrutura do reservatório.
Também coordenador técnico do Dnocs, João Guilherme explica que a barragem conta com um sistema de drenagem, através de calhas, que direciona toda a água que cai sobre a parede. Porém a chuva que cai sobre a lateral da parede, entre uma calha e outra, termina escoando diretamente na areia. “Pela própria dimensão da barragem e pela altura da parede, essa água ganha velocidade e causa a erosão, mas não representa nenhum risco para a obra”, diz.
Barragem
A barragem Eng. Armando Ribeiro Gonçalves foi inaugurada em 1983. Construída pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) está localizada na bacia do rio Piranhas-Açu, a cerca de 200 km de Natal. Sua capacidade de 2,4 bilhões de m³ de água é a maior dentre todos os reservatórios do Rio Grande do Norte e sua bacia abrange uma área de 195km². As últimas medições realizadas no local e registradas no site do Dnocs, datadas de dezembro, apontam para um volume atual superior a 2 bilhões de m³, ou seja, 85% da capacidade total. Nos últimos dois “invernos”, o reservatório sangrou, contribuindo para enchentes que inundaram plantações e a área urbana de Ipanguaçu.
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